As Agressões que Ignoramos
Por Rosemeire Zago
06/03/2010
Muitas vezes, somos vítimas de agressões que nem sempre nos damos
conta e que com muita freqüência acontecem entre pais e filhos,
famílias, casais, pessoas que se amam, enfim, nas relações
cotidianas. Muitas delas nos causam culpa, doenças, conflitos.
Parece ser difícil perceber essas agressões e, principalmente, os
ferimentos que causam, pois em geral só é enfatizada a violência
física e explícita. As agressões silenciosas nem sempre deixam
marcas externas, físicas e visíveis, mas conseguem deixar marcas
eternas.
Muita violência velada é transmitida pelas famílias nas entrelinhas
da comunicação diária, mediante conselhos, avisos e cuidados que nos
impedem de entrar em contato conosco e com nossas necessidades.
Quantas famílias, ainda nos dias de hoje, ensinam que sentir e
expressar sentimentos é sinal de fraqueza? Quantas vezes não fomos
ou somos comparados com o irmão que é mais inteligente e que tira as
melhores notas? Ou ainda, as críticas sob o legado, que são
construtivas e para nosso bem? Que bem é esse que nos lembra a todo
o momento que tudo que fazemos é errado? Por que é tão difícil
elogiar o outro, valorizando o que faz de bom? Talvez por que irá
percebê-lo como melhor? É mais fácil e tão somente, criticar?
Quantas pessoas não percebem que continuamente agridem do mesmo modo
que foram agredidas? E quantas outras não permitem ser agredidas
mesmo adultas? Quantas pessoas por medo permanecem acorrentadas, sem
motivação interior para mudar, preferindo o comodismo, conformismo,
aceitação, ainda que isso traga muito mais sofrimento que a mudança
em si? Por que as pessoas esquecem que ao nascer todos trazemos
dentro de nós a potencialidade para ser feliz e viver em paz? O
controle e as manipulações estão presentes para dominar as emoções
do outro e, inconscientemente, limitar seu crescimento.
Será que as pessoas são conscientes do quanto foram ou são vítimas
da agressividade silenciosa ou o quanto reproduzem essa mesma
agressividade sem se darem conta? Digo vítimas, pois constantemente
são feitas com crianças. Será que o agressivo percebe quanto destrói
a si mesmo e todos que estão à sua volta? Muitas vezes são pessoas
tão destruídas por dentro que nem se dão conta da própria dor ou
agressividade, ignorando esses comportamentos por considerá-los
normais.
As agressões silenciosas são sutis e nem sempre são fáceis de serem
percebidas, e por isso, perigosas. Muitas vezes são simples gestos,
olhares, que reprovam, censuram, julgam. Em muitos casos, podem
gerar doenças e quase sempre aquele que adoece num grupo familiar,
inconscientemente, revela a doença latente do próprio grupo, sendo
freqüentemente aquele que procura ajuda, não por ser o mais doente,
como muitos acreditam, mas sim o mais sensível. O perigo é reforçado
pelo aspecto repetitivo das atitudes agressivas, fazendo com que os
envolvidos se acostumem com tais atitudes, podendo ser consideradas
normais tanto por quem faz como por quem as recebe. Muitas pessoas
mantêm relacionamentos afetivos mesmo quando não há respeito,
carinho, afeto, com total desinteresse pelo que faz e,
principalmente, pelo que sente; da mesma maneira que foram tratadas
durante suas vidas e acabaram se acostumando a essa realidade. Não
conseguindo identificar a origem, os padrões se repetem, pois nem
sempre há a consciência da agressão recebida. O que pode levar ao
outro extremo, sentir-se agredido mesmo que não tenha sido,
interpretando erroneamente alguns fatos e agindo também de modo
agressivo.
Um exemplo muito simples é quando se referem a alguém como coitado,
isso pode gerar um sentimento de alguém como incapaz de se defender.
Ou ainda, quando ouvimos: fiz por você, ou não me separei por você.
A princípio pode parecer uma frase de alguém preocupado com nosso
bem-estar, uma aparente valorização, mas na verdade, revela uma
provocação para que se sinta culpado, como se fosse: veja como me
sacrifico por você. Ou quando foi fazer um desabafo e foi julgado em
seus sentimentos, como se sentiu? Uma pessoa constantemente
desvalorizada em tudo que faz, pensa ou sente, tratada com
indiferença, desprezo, dificilmente acreditará em si mesma. E isso
não é uma agressão silenciosa? Há muitos outros exemplos, basta
lembrarmos com atenção frases que ouvimos, gestos que observamos,
perguntas ou comentários que nos constrangem ou nos induzem a não
reagir ou nos defendermos. Tudo aquilo que nos fere, nos agride,
ainda que não seja pela violência explícita, com tapas e berros,
pode ser considerada uma agressão silenciosa.
Passe um filme mentalmente sobre sua vida e perceba quantas
agressões silenciosas não gritam ainda hoje, talvez depois de anos,
dentro de você. Perceba quantas vezes se sentiu agredido e por não
reconhecer esse fato, ainda se permite ser. O conhecimento dessas
agressões pode ser muito doloroso, mas não será mais doloroso e
destrutivo manter esses padrões? Só identificando seu sofrimento
poderá buscar soluções e mudar aquilo que acredita ser necessário
mudar. A dor será muito menor do que continuar ignorando as
agressões que viveu, ou ainda, se permite viver.
Rosemeire Zago é psicóloga clínica, com abordagem junguiana e
especialização em Psicossomática. Desenvolve o autoconhecimento
através de técnicas de relaxamento, interpretação de sonhos,
importância das coincidências significativas, mensagens e sinais na
vida de cada um, promovendo também o reencontro com a criança
interior. Email: r.zago@uol.com.br