Ajuda Terapêutica do eletrossono nas psicopatologias
Por Dr. Wagner Paulon
01/05/2008
O diálogo (quando o terapeuta usa a persuasão, isto é, a
argumentação com recomendações verbais apelando para a lógica e o
raciocínio do paciente) e a boa relação terapêutica favorecem a
formação de novos condicionamentos positivos em substituição aos
reflexos condicionados patológicos; e na hipnose a repetição
concentrada dos condicionamentos sugeridos em vigília vem reforçar
de forma mais intensa a assimilação desses condicionamentos.
A origem da hipnose é tão antiga quanto a humanidade, e os seus
fenômenos, embora não identificados como tais, estavam presentes nos
primórdios da civilização. Inicialmente envolvida em mistério,
misticismo e superstições, e estreitamente relacionada com os
rituais religiosos, foi situada pela primeira vez dentro do
interesse científico pelo médico austríaco Franz Anton MESMER
(1734-1815). É dele a "Teoria do Magnetismo Animal", que atribuía os
fenômenos de cura a um complicado e imaginoso sistema de fluidos,
ímãs e forças universais atuando sobre a saúde humana.
Vários outros teóricos da hipnose apareceram depois dele, tomando
por base seus trabalhos ou partindo de pontos inteiramente opostos:
Elliotson, Esdaile, Bennet, Charcot, Myers, Janet, Prince e Ferenczi
foram os mais destacados, mas suas teorias passaram bem ao largo da
hipnose tal como é hoje compreendida. James BRAID (1795-1860) foi o
primeiro a traçar um esboço da neurofisiologia da hipnose, chegando
a conclusões que, em parte, são válidas até hoje.
A interpretação reflexológica dos fenômenos hipnóticos constituiu o
primeiro marco realmente significativo na história da hipnose.
O surgimento freqüente do sono nos animais submetidos por PAVLOV e
seus colaboradores aos trabalhos de reflexos condicionados foi o que
determinou que o notável fisiólogo se empenhasse em estudá-lo. Após
dez anos de trabalho, em 1923 chegou à concepção e compreensão
finais do fenômeno.
O córtex cerebral, de acordo com suas complexas funções, tem também
uma estrutura complexa, integrada no ser humano por 10 a 15 bilhões
de células nervosas. Estas células são de estrutura variada,
assegurando conexões múltiplas entre as diversas partes do córtex e
entre o córtex e o subcórtex. Relacionadas entre si por meio dos
seus dendritos e axônios formam complicadas cadeias de neurônios
através das quais se difundem as excitações que chegam ao córtex. As
fibras que vão ao córtex provindas do subcórtex e as que unem entre
si as diversas zonas corticais se entrelaçam, por meio de suas
ramificações terminais, com os dendritos das células das diversas
camadas corticais, transmitindo-lhes a excitação; essa excitação é
então difundida pelos axônios das células de uma para outra parte do
córtex ou diretamente para os centros subcorticais.
As excitações que chegam ao córtex cerebral se irradiam de uma
camada para outra e de uma para outra zona dos hemisférios, de
maneira que a totalidade dos neurônios corticais fica dividida em
numerosos pequenos centros. Em parte esses centros estão excitados,
enquanto outros estão inibidos; forma-se assim um mosaico, cortical
de pontos excitados e pontos inibidos. Este mosaico, altamente
móvel, modifica-se constantemente sob a ação dos distintos estímulos
que atuam sobre o indivíduo.
A excitação da célula nervosa está relacionada com um débito
energético que, em última análise, vem a ser um certo consumo de
substância, constituindo o "gasta funcional". Conforme a escola
reflexológica, quando este gasto atinge um ponto tal que põe em
risco a capacidade funcional da célula, instala-se a "inibição
protetora % supramaximal, que lhe serve de repouso e permite assim o
restabelecimento de sua atividade normal”.
Uma das formas de manifestação dessa inibição protetora é o sono,
que se inicia quando o trabalho prolongado das células corticais
representa um perigo para o seu funcionamento regular. Desse modo,
dentro desse conceito e de acordo com as leis que regem os processos
de excitação e de inibição, o sono é uma inibição irradiada a todo o
córtex cerebral e às áreas subcorticais próximas. Durante o sono o
mosaico funcional desaparece, ficando todo o córtex num estado de
inibição difusa.
Pela ação prolongada e monótona de um estimulo qualquer se pode
produzir uma forma especial de inibição difusa do córtex cerebral: o
sono hipnótico.
Esta inibição inicia-se em torno do ponto cortical onde esteja
atuando o estímulo, e a partir daí se difunde; permanecem,
entretanto, determinados grupos de células não inibidas, mantidas em
excitação (vigília) pela palavra, através das quais o indivíduo
hipnotizado conserva a sua relação com o hipnologista,
caracterizando-se assim uma diferença fundamental entre o sono
hipnótico e a sono normal. Esses grupos de células não inibidas
formam um ponto que PAVLOV denominou de "ponta vígil" do córtex
cerebral (ponto de vigília).
Assim sendo, a hipnose pode ser definida, dentro da Reflexologia,
como "um estado de difusa inibição cortical com a preservação de um
ponto vígil".
É a oportunidade que o psicoterapeuta tem de utilizar a sugestão
(vide pág. 98), inserindo na ANS do paciente novos condicionamentos
sem a sua interferência crítica. Aí a palavra tem um papel ainda
mais destacado, pois deve ser precisa, positiva e de conteúdo
extremamente significativo para o paciente.
Para que o paciente possa realmente levar à prática essa nova
mecânica de vida, é preciso que seu sistema nervoso esteja em
condições satisfatórias.
Vimos acima como funciona o processo de restauração das células
através do sono. A sonoterapia química não é recurso recente da
psiquiatria. O eletro-sono, porém, vem acrescentar uma série de
vantagens a essa sonoterapia tradicional, eliminando de saída dois
pontos negativos — a necessidade de internamente e a superdosagem de
tranqüilizantes. O eletro-sono foi construído na década de 40 por V.
GUILLIAROVSKI e outros cientistas russos, com base na doutrina
reflexológica, considerando que "estímulos débeis e monótonos
provocam nas pessoas um estado de languidez, de sonolência e até de
sono". Embora algumas pessoas não cheguem propriamente a dormir, o
estado produzido pelo eletro-sono é semelhante ao sono fisiológico e
também ao sono hipnótico, com a diferença de introduzir um elemento
novo: a eletricidade. O aparelho, pequeno e de prática utilização em
regime de ambulatório (de uma a duas horas diárias, num total de 20
a 30 aplicações num tratamento normal), tem as seguintes
características: corrente pulsatória retangular (galvânica);
freqüência de impulsos de 5 a 25 Hz (e, num diapasão mais amplo, de
l a 130 Hz); duração fixa de impulsos (numa faixa de •0,3 a 0,5
milisegundo); e intensidade de estímulos regulada para cada
paciente. É aplicado através de óculos com algodão umidecido
colocados sobre os olhos e sobre as mastóides (ossos atrás das
orelhas); a corrente elétrica entra pelos óculos que estão sobre os
olhos e sai pelos que estão nas mastóides. No início da aplicação, o
paciente sente um agradável formigamento nas pálpebras. E, mesmo que
não chegue a dormir, seu sono da -noite será sempre muito melhor.
Como resultado imediato produz-se um grande relaxamento, o que
possibilita um desempenho mais adaptativo nas atividades cotidianas
do paciente, desde o trabalho até a racionalização de sua
problemática.
O Neurotron, construído em 1969 pelo médico brasileiro Fernando
THIRÉ, utiliza a corrente farádica e consta de aplicadores
(eletrodos) de folha metálica flexível que se colocam de preferência
nas plantas dos pés, ou nos tornozelos, panturrilhas (barrigas das
pernas) ou coxas, sempre simetricamente.
O paciente, uma vez ligado o Neurotron, sente também uma espécie de
formigamento no local da aplicação, formigamento esse que sobe pelo
tornozelo e pode ter sua intensidade mais acentuada dependendo do
caso.
A aplicação do Neurotron também determina uma tonificação dos
processos nervosos fundamentais e é indicado particularmente nos
distúrbios neuro-vegetativos, pois atua através dos troncos nervosos
vegetativos (viscerais) e sensitivos (da vida de relação). Pode
levar igualmente ao sono durante o período de aplicação, o que
significa uma influência cortical canalizada através da inervação
periférica dos membros inferiores.
Naturalmente, o campo da psicoterapia é aquele dos distúrbios
nervosos chamados psicogênicos; os somato-gênicos exigirão, antes de
qualquer coisa, tratamento especializado paralelo à psicoterapia.
Uma vez assegurado o equilíbrio da ANS do paciente, e com o novo
plano de vida já em fase adiantada de elaboração dentro do processo
de interferir em tudo o que sinaliza a neurose (sugerir mudança de
ambiente, trabalho remunerado, aquisição de hobbies), a psicoterapia
reflexológica vai fazer a abordagem das pessoas que possam ter
contribuído, direta ou indiretamente, para o desencadeamento de sua
neurose. Se for o caso de uma paciente casada, chama-se o marido;
primeiro o terapeuta o entrevista isoladamente, expondo-lhe a
situação de forma a que ele a compreenda e passe a participar
positivamente do tratamento; em seguida reúne-se o casal, passando
assim à psicoterapia do grupo familiar. São freqüentes os casos de
jovens que trazem os pais, pais que trazem os filhos, expondo assim
ao terapeuta o restante da constelação familiar neurotizada. O
terapeuta age nestas sessões como o poder moderador, orientando os
debates que surgem inevitavelmente a princípio, esclarecendo pontos
confusos e agindo no sentido de harmonizar o grupo. É traçado,
então, um programa de vida a ser cumprido num prazo determinado, ao
fim do qual o paciente inicial ou o grupo voltarão à clínica para
que possa ser feita uma avaliação dos resultados. Dependendo do
caso, novo programa é organizado, e às vezes com vista a um
terceiro; ou o paciente simplesmente não volta, porque conseguiu
superar seu desajuste e entrar em harmonia com o seu grupo
ambiental.
Dr. Wagner Paulon - Formação em psicanálise (Escola Paulista),
mestre em psicopatologia (Escola Paulista), psicologia (Saint
Meinrad College) USA, pedagogia (FEC ABC), MBA (University Abet)
USA, curso de especialização em entorpecentes (USP), psicanalista
por muitos anos de vários hospitais de São Paulo.