A Angústia da Vida Profissional
Por Jerônimo Mendes
11/01/2009
Com relação ao mundo corporativo, costumo dizer o seguinte: manda
quem pode, obedece quem precisa, muda quem tem juízo. Essa última
parte é por minha conta, mas eu já pensei diferente no passado.
Reconheço que é bem mais fácil pensar assim depois de certa idade,
quando você sabe exatamente o que quer e, principalmente, quando
você trabalha de cabeça erguida, graças ao seu esforço, dedicação e,
sem dúvida, um pouco de sorte. Dessa forma, pensar diferente é um
exercício gratificante para não se deixar escravizar apesar da
necessidade que, na maioria dos casos, sempre fala mais alto.
Entender o ditado requer interpretação em três etapas. “Manda quem
pode” é algo típico da Idade Média, quando os senhores feudais
dominavam vastas propriedades de terras e os servos e vassalos
viviam à mercê do seu temperamento nada amistoso, portanto, qualquer
descontentamento era sinônimo de ameaça e, para evitar conflitos,
cuja pena máxima era a perda de proteção ou a expulsão do feudo, a
alternativa mais sensata era obedecer. Assim foi no tempo da
escravidão, quando os reis, imperadores e senhores de engenho
detinham a propriedade do indivíduo, de papel passado, em regime
absoluto de escravidão. Durante essa fase repugnante da nossa
história, isso era comum.
“Obedece quem precisa” surgiu mais adiante quando Frederick Taylor,
o precursor da administração científica do trabalho, instituiu o
conceito de chefia e organização e instituiu, de forma veemente e
unilateral, que alguns nascem para mandar, outros para fazer.
Naturalmente, quem nascia para a execução morreria sob esse estigma
e poderia se tornar um obediente operário até o fim da vida. Por
essa razão, Taylor era meio paranóico, obcecado por controle e
produtividade.
“Muda quem tem juízo” é a minha praia, por assim dizer. Considero a
melhor atitude para se livrar do ditado original. Embora eu tenha
sido forçado à mudança há algum tempo e isso tenha me proporcionado
um bem danado, eu posso dizer que se trata de um dilema difícil de
ser solucionado e isso não é privilégio de poucos, ao contrário, é o
caso da maioria dos profissionais do mundo moderno.
A mudança é o caminho mais adequado para livrá-lo dessas tolices que
mancham o mundo corporativo e para colocar todo o seu potencial em
prática num lugar onde você possa ser tratado, literalmente, como
ser humano. Você é a única pessoa capaz de reverter o quadro
depreciativo que pintam a seu respeito e a respeito do seu trabalho,
por mais esforçado que você tente parecer.
De acordo com pesquisa divulgada na Revista Negócios (Edição n. 3,
maio de 2007), o ambiente de trabalho se tornou fonte de
infelicidade para presidentes e diretores de grandes empresas e, por
experiência própria, estendo essa infelicidade geral para outros
níveis hierárquicos que sofrem diferentes tipos de pressão por
resultados cada dia mais insaciáveis.
Ainda segundo a pesquisa, realizada com mais de mil executivos de
350 empresas, a angústia da vida executiva é algo digno de reflexão.
Dentre os principais resultados obtidos, a pesquisa aponta que 84%
dos executivos se dizem infelizes no trabalho, 54% que se dizem
insatisfeitos com o tempo dedicado à vida pessoal e 35% deles
apontam os problemas com o chefe como a crise mais marcante da sua
vida, o que não é tanta novidade assim.
Por um lado, o excesso de trabalho, por outro, a falta dele. Ambos
têm a ver com a dignidade humana, relegada com freqüência ao segundo
plano. Albert Camus, filósofo francês, lembra que não existe
dignidade no trabalho quando este não é aceito livremente. Pior
ainda quando não é aceito de forma alguma.
Concordo plenamente com o escritor James Hunter, autor de O Monge e
o Executivo, quando diz que “os seres humanos têm um profundo anseio
por significado e propósito em sua vida e retribuirão a quem os
ajudar a atender a esta necessidade. Eles querem acreditar que o que
estão fazendo é importante, que serve a um desígnio e que agrega
valor ao mundo”. Isso vale para o mais simples dos mortais.
Meu pai ficou praticamente 30 anos na mesma empresa repetindo esse
ditado e por vários lugares onde passei havia sempre um insatisfeito
que parecia ter assumido o lugar dele, mas não o condeno. Ele foi
feliz do seu jeito e, apesar dos revezes, sobreviveu e conseguiu
criar os filhos com dignidade.
Embora as circunstâncias mudem e as oportunidades sejam freqüentes,
muitos profissionais ainda se submetem a essa filosofia de vida, por
medo ou insegurança, enquanto o verdadeiro potencial vai lhe
escapando pelo vão dos dedos sem que o mesmo seja capaz de esboçar a
mínima reação. Isso soa um pouco deprimente.
O fato de não ter conseguido livrar-me definitivamente desse ditado
me fez reconstruí-lo a fim de torná-lo mais digerível e para
repensar a maneira de ver o mundo. Leva tempo para conseguirmos
destruir alguns paradigmas plantados em nossa cabeça
involuntariamente. Hoje, cada vez que alguém dispara essa máxima
perto de mim, eu complemento: “e muda quem tem juízo”.
Graças a Deus, conheço um numero razoável de profissionais que deram
a volta por cima e, a despeito de todas as dificuldades encontradas
no caminho, tiveram a coragem de reposicionar-se no mercado para
conquistar um lugar ao sol, optando, em muitos casos, por uma renda
menor ao reconsiderar o fato de que o dinheiro jamais conseguirá
compensar a ausência de paz de espírito.
O mundo é repleto de oportunidades e, por menos conhecimento que
alguém possa apresentar sobre determinado assunto, existe uma força
sobrenatural dentro de cada ser humano capaz de transformá-lo em
exímio conhecedor daquilo que ele estiver realmente determinado a
realizar. É praticamente impossível o universo não trabalhar a seu
favor se você estiver convicto de que as adversidades são condições
temporárias e que a força de vontade e a determinação são as únicas
virtudes capazes de recolocá-lo num ambiente mais merecedor da sua
energia, da sua inteligência e da sua valiosa companhia.
Olhe ao redor e admire a legião de profissionais que abriram mão de
um cargo altamente promissor em grandes corporações e seus
respectivos benefícios em troca de mais dignidade, mais qualidade de
vida e mais tempo para a família. E mais, quantos amigos e colegas
de trabalho pararam de brigar consigo mesmo, com o chefe e com a
conta bancária partindo para uma missão diferente muito antes de
você esboçar a primeira reclamação.
Existem inúmeras empresas onde o ditado prevalece, por pouco tempo,
creio eu. Hoje, manda quem pode, obedece quem precisa e muda quem
tem juízo, pois é necessário evitar ambientes onde o regime feudal
deixou resquícios. Assim sendo, quero compartilhar algumas dicas que
poderão ajudá-lo no seu ritual diário de crescimento e
desenvolvimento pessoal. Espero que sejam úteis.
1. Ninguém tem o direito de ferir a sua dignidade; quando sentir que
o ambiente está afetando a sua auto-estima e a sua dignidade, ou
você muda de ambiente ou enfrenta o problema ou pára de reclamar
para sofrer menos do que o necessário; a primeira é mais
gratificante;
2. Considere que poucos líderes estão preparados para enfrentar o
diálogo aberto e consistente quando alguém questiona o clima
organizacional; quando isso ocorre, geralmente eles são pegos de
surpresa; você conhece algum chefe propenso a admitir sua maneira
equivocada de conduzir a equipe?
3. Mudar é mais difícil do que se imagina; é muito mais prático
suportar a pressão e chorar sozinho do que perder o emprego, o
crachá e o plano de saúde, portanto, releve certas coisas e seja
menos rígido na avaliação; digo isso porque já fui mais rígido do
que o necessário e isso não me ajudou em nada, ao contrário, paguei
um preço alto;
4. Lembre-se que nem tudo é para sempre e, felizmente, a vida é
feita de mais momentos alegres do que tristes.
A angústia da vida profissional é eterna. Por mais recompensadora
que possa parecer, a aposentadoria será o início de novos dilemas
que surgirão com a idade e com a eterna necessidade de se sentir
útil perante a sociedade. Como diz o César Souza, autor de Você é o
tamanho dos seus sonhos, se você não existisse, o universo não seria
o mesmo. Portanto, pare de sofrer com coisas pequenas e comece a
provar a si mesmo que você é superior a tudo isso.
Nada resiste ao trabalho e ao desejo irreversível de subir na vida.
Se você mantiver uma postura irreparável no caminho e assumir o
compromisso de crescer e de aprender todos os dias até o fim da
vida, ainda que você tenha de cair e levantar inúmeras vezes, seus
pais, seus verdadeiros amigos e, principalmente, sua família,
agradecem, de coração. Pense nisso e seja feliz!
Jerônimo Mendes é Administrador, Consultor e Palestrante
Autor de Oh, Mundo Cãoporativo! (Qualitymark) e Benditas Muletas
(Vozes)
Mestre em Organizações e Desenvolvimento Local pela UNIFAE