Aspectos Bio-Psico-Sociais dos Transtornos de Ansiedade e de Humor
Por Jorge Antônio Monteiro de Lima
12/03/2007
As origens etiogênicas dos transtornos de ansiedade, da depressão e
transtornos de pânico ainda estão hoje em dia muito longe de serem
completamente definidas. Diariamente novas descobertas vem
ocorrendo, e a ciência crescendo.
Impõe se contudo um paradigma: existe uma ciência esgotada em suas
possibilidades? Podemos fazer de nossa prática profissional uma
profissão de fé embasada em dogmas? Temos observado a realidade
presente em nossos pacientes e buscado formas integradas de atuação?
Este dilema vem aumentando gradativamente na área de saúde mental
com a cisão do ser humano em partes específicas, dissociadas, e que
agravam o quadro dos tratamentos e prognósticos. Mas quem na ciência
tem razão?
Na prática estas patologias tem sintomatologia que atinge o ser
humano em sua totalidade nos campos de sua existência plena:
biológico, mental, afetivo, espiritual. Com o avanço da neurociência
e após as pesquisas avançadas com a AIDS e Câncer, pesquisadores
chegaram a conclusão que todo sistema imunológico é regido por nosso
estado afetivo. Isto nos impõe a realidade da subjetividade humana,
a quebra de padrões cartesianos e lineares, a especificidade da
segmentação. Cada caso passa a ser um caso único. Mas nossa ciência
na atualidade verga se para outro lado.
A retaliação crescente da área de saúde em campos de especialização
cada vez mais segmentados agrava este quadro no mais puro
"academicismo", a pior patologia de nossa sociedade. Busca se em
disputa de poder, dinheiro, autoridade, vaidade a sobreposição de
uma determinada área sobre as demais numa guerra insana e tosca. e
com isto a sobreposição de teorias infundadas ante a prática e ao
sofrimento quotidiano dos pacientes que padecem. soma-se a este
processo no Brasil o sucateamento da área de saúde pública, a
mercantilização dos sistemas de atendimento em geral, o crescimento
dos planos de saúde em detrimento da saúde pública.
Os profissionais de saúde mental, dentre outros, vem caindo numa
armadilha frente a seu campo de atuação: quantidade versus
lucratividade, ou seja, quanto mais pacientes atender em curto
espaço de tempo maior o lucro. Isto vem fazendo um verdadeiro
"rombo" tanto na saúde pública quanto na rede de convênios na saúde,
trazendo diagnósticos precoces e precários, baixa qualidade de
atenção e atendimento, e a incapacidade de apreensão do profissional
frente aos problemas e patologias de seu paciente. Do diagnóstico
comprometido a um prognóstico lamentável um passo de ameba.
Emerge neste caos a busca de sistematizações estilo "fast food",
receitas prontas, cartesianismo barato e tosco, enfim tratamentos
sintomáticos superficiais que agregam o modelo de velocidade e
lucratividade em série. Contudo a saúde mental não pode nem deve ser
vista como um paradigma de produtividade em série sempre buscando
alta lucratividade. Neste sentido vimos medicamentos prometendo por
seu marketing agressivo soluções milagrosas, psicoterapias rápidas
com efeito imediato "em poucas sessões", tudo em nome da ciência? E
quantas destas verdades absolutas com o passar de 2 ou 3 anos não
caíram por terra? Quantas terapias da moda não eram apenas marketing
puro?
Não bastasse o caos a que já estamos imersos, a política resolve
contribuir para a falência total da saúde no país com a lei do "Ato
médico" quebrando os avanços da saúde e dos sistemas
interdisciplinares, por pura busca de reserva de mercado. Esta lei
acaba impondo os tratamentos de saúde a responsabilidade única e
exclusiva do médico. Como se os conselhos regionais e federal de
medicina conseguisse se auto gerenciar e cuidar de sua própria
categoria evitando os freqüentes escândalos. A curto prazo o ato
médico inviabilizará a saúde do país, que detém falta absoluta de
profissionais de saúde em todas as áreas. O que seria dos postos de
saúde do S.U.S. não fossem as equipes de enfermagem?
Nesta guerra de interesses sobra para os pacientes que são legados a
quinto plano. Do interesse político a propagação de ideologias e
pesquisas "encomendadas" uma vírgula.
Pesquisando patologias ligadas a saúde mental nos maiores compêndios
de psiquiatria DSM IV; Sid10; Kaplan; e outros notamos que os mais
renomados cientistas mantém clara sua posição de que os transtornos
mentais, os transtornos de ansiedade, a depressão e os transtornos
de pânico tem origem multifatorial. Embora por vezes exista uma
carga genética e uma predisposição biológica presentes em um
indivíduo, os fatores psíquicos, sociais, afetivos vão estar
presentes de forma plena na etiologia e manutenção destes estados
patológicos.
Gostaria de citar o médico psiquiatra Leonard Kramer em sua obra
"Saindo da depressão" de 1974, nela Kramer aponta que os tratamentos
segmentados para a depressão tem efeito pequenos. Os pacientes que
trataram se exclusivamente com medicação tinham melhora de 30%. Os
que tratavam se exclusivamente com psicoterapia 32% e os que
tratavam se com ambas formas concomitantemente 72%.
Em nossa experiência prática confirmamos o que Kramer dizia e
ampliamos sua margem de êxito para 85% agregando outras técnicas as
formas de tratamento, como a fitoterapia, homeopatia, acupuntura,
terapia de grupo, terapia ocupacional. O mesmo valendo para
transtornos de ansiedade e transtornos de pânico. A agregação de
novas técnicas traz a tona inúmeras possibilidades e uma maior
flexibilização dos tratamentos.
A experiência de Kramer mostra nos claramente que o marketing
intenso do mercado da saúde não resolverá o problema dos pacientes
se a visão manter se no processo de segmentação do ser humano.
Atualmente a indústria farmacêutica investe aproximadamente 200
bilhões de dólares em pesquisas para descobrir novas moléculas para
tratamento na saúde mental. Os avanços da farmacoterapia são
espetaculares oferecendo medicamentos de ação rápida e com poucos
efeitos colaterais. Contudo boa parte dos psiquiatras vem
distanciando se do aspecto mental de seus pacientes voltando se
exclusivamente a seus componentes biológicos e genéticos, quebrando
a própria história da psiquiatria e seus avanços.
Da mesma forma na psicologia quando esta emerge de forma segmentada
não compreendendo a importância dos tratamentos médicos, a ação dos
medicamentos e emprego de outras técnicas. E o que falar então de
agregar outras possibilidades como por exemplo a fitoterapia e a
homeopatia extremamente indicadas aos pacientes no processo de
"desmame" de medicações controladas como os soníferos e
ansiolíticos.
A conseqüência direta da segmentação dos tratamentos e do ser humano
é a Cronificação do estado patológico dos pacientes, o aumento do
tempo de tratamento e a ineficácia. Isto coloca pacientes com
depressão em tratamentos por 10, 12 e até 25 anos como observamos em
nossa prática. E quanto maior a cronificação maior o grau de
intoxicação, e o tempo gasto para uma futura melhora. Segundo dados
da O.M.S. a depressão encontra cura total em 70% dos casos atendidos
em período de até 7 meses. Contudo inúmeros profissionais de saúde
renegam esta cura e a possibilidade de melhora de seus pacientes.
Ainda pensando na depressão, manter um paciente em longo espaço de
tratamento passa a ser um risco considerável visto que a vontade de
morrer pode induzi- lo a buscar suicídio.
Falando especificamente da questão biológica e genética encontramos
outro paradigma. Diariamente temos visto noticiado a descoberta de
um gene responsável por esta ou aquela doença. Descobertas
maravilhosas vem emergindo que trarão inúmeros avanços sobretudo a
medicina e saúde. Contudo na atualidade estamos incomensuravelmente
longe de ter nestas descobertas práticas de atuação visto que estas
ainda levarão décadas para estarem a disposição do mercado. Outro
fator é que nenhuma destas descobertas coibi ou aniquila o impacto
do sistema imunológico e do cérebro e da afetividade na etiologia e
manutenção destas patologias. Por exemplo em um esgotamento nervoso
e físico(estresse) culminando em transtorno de ansiedade. Em minhas
observações clínicas deparo me semanalmente com um fato: a
correlação direta e clara entre ansiedade e a gastrite e a ulcera
estomacal. Muito embora já seja comprovado que tanto a gastrite e a
úlcera advém de uma bactéria, isto não dissocia o estado de humor
dos pacientes que na prática apresentam se com altos graus de
estresse, sistema nervoso abalado e ansiedade. As causas da
depressão são variadas. Alguns tipos podem ser herdados de
familiares, já que estes tem uma vulnerabilidade biológica para a
doença. Famílias em que mais de uma pessoa apresente uma doença como
a depressão apresentam maior chance de que isto se repita nas
gerações futuras.
Em nossas observações clínicas não descartamos o grau de estresse
vivido pelos familiares destes pacientes, sobretudo as crianças que
absorvem tais comportamentos de seus pais e figuras de autoridade,
entrando em certo grau de "contágio" psíquico frente ao meio. O
convívio com um paciente em crise é extremamente difícil, exigindo
muita atenção de seus familiares. Existem neste sentido inúmeros
relatos de que os animais de estimação que vivem em casas cujos
donos portam estas patologias adoecem da mesma forma. A depressão
típica também pode ter como causa a hereditariedade apesar de poder
aparecer em pessoas que não apresentam histórico da doença na
família. Hereditária ou não, a depressão é associada a certa falta
ou exagero de componentes químicos.
Em nosso cérebro há mensageiros químicos chamados
neurotransmissores. Esses mensageiros ajudam a controlar as emoções.
Os dois mensageiros principais são a serotonina e a norepinefrina.
Os níveis deles aumentam ou diminuem, mudando nossas emoções. Quando
os neurotransmissores encontram-se "em equilíbrio", sentimos a
emoção certa para cada ocasião. Quando alguém está deprimido, os
mensageiros químicos não estão em equilíbrio. Isso significa que
alguém pode se sentir triste quando deveria estar alegre. Ainda não
está claro por que isso ocorre em algumas pessoas e não em outras.
eventos estressantes ou perdas. É normal sentir-se triste após uma
perda, como a morte de um ente querido ou o rompimento de uma
relação. Às vezes essa tristeza pode se transformar em depressão, em
pessoas que têm essa tendência. Problemas de dinheiro, trabalho ou
outros problemas pessoais podem também desencadear a depressão.
doenças físicas. Algumas doenças, como esclerose múltipla ou
derrame, podem causar alterações cerebrais que levam à depressão.
Outras doenças podem levar à depressão porque são dolorosas e mudam
a vida das pessoas.
níveis hormonais. Os hormônios são substâncias que se encontram no
organismo. Se os níveis de hormônios entrarem em desequilíbrio, a
depressão pode surgir. Por exemplo, pessoas com problemas da
tireóide podem ficar deprimidas.
o uso de certos medicamentos, drogas ou álcool. Alguns medicamentos,
como os remédios para pressão alta, podem causar depressão. (Se isso
ocorrer, entre logo em contato com o médico.) O álcool e algumas
drogas ilegais podem piorar a depressão. Não é bom que os deprimidos
usem essas substâncias, mesmo que pareçam ajudar momentaneamente.(1)
No tocante a questões psicológicas as causas mais freqüentes que
geralmente encontramos ligadas aos transtornos de ansiedade e de
humor são geralmente subdivididas em 3 grandes grupos:
1) Perda de sentido de vida
Este aspecto implica na perda de uma ideologia, objetivo de vida, da
possibilidade de auto realização, dos componentes sagrados de um
indivíduo. Ex., um homem que foi militante de esquerda por toda sua
vida, nos procurou com depressão por ver todo seu empenho de vida
desmantelado, todos seus ideais e luta desperdiçados visto que seu
partido de esquerda agora tornou se descaradamente de direita. Este
homem sentia que fora traído, enganado por toda sua vida,
envergonhado por ter trabalhado anos a fio em prol de um engodo. Era
um sonhador, alguém que acreditava em mudanças, e que viu seus
colegas de luta expulsos de seu partido por serem coerentes.
Associava se a este quadro uma intensa baixa da auto estima, vontade
de se isolar, descrédito generalizado em tudo e todos. Sua vida era
uma bandeira branca com estrela vermelha que carregava e que foi
manchada pelo sangue de seus colegas.
A intensidade da carga afetiva presente nos objetivos de auto
realização será proporcionalmente equivalente a carga da crise pela
perda do sentido de vida, pois toda esta energia que estava ligada a
uma meta( objeto) voltar se há para o Eu(Ego) repentinamente de
forma negativa aliando se a Complexos com tendência patológica que o
paciente venha a apresentar.
2) Crises afetivas
A decadência social dos relacionamentos interpessoais impõe se a
nós, aliada a crise ética, moral, econômica,... Em nossa experiência
prática observamos que as crises afetivas são em boa parte dos casos
o fator etiogênico dos transtornos afetivos e de humor, gerando pelo
aumento de ansiedade, estresse, tensão nervosa uma crise inicial
latente. Perda de uma pessoa amada, crise conjugal, quebra de um
noivado ou namoro, desilusão, solidão, o medo de ficar só e a
incapacidade de consegue um vínculo amoroso, e as famosas crises
familiares permeiam este universo tão comum a prática da
psicoterapia.
A questão afetiva comprovadamente pela neurociência moderna traz a
luz a ligação direta entre nosso sistema nervoso e a afetividade que
acabará regendo todo cérebro e sistema nervoso. Neste sentido a
subjetividade humana, os fatores inconscientes, assumirão
importância vital e clara na etiologia de transtornos de ansiedade e
de humor. O peso de uma afetividade mal resolvida alem disto pode
agravar toda uma série de processos patológicos visto que esta mesma
afetividade regerá a resposta do sistema imunológico.
Ex.: Uma moça de 23 anos procurou nos com transtorno de pânico
apresentando todos sintomas claros. Ao levantar sua história de vida
mais detalhadamente ao longo das primeiras sessões da psicoterapia
nos deparamos com uma crise afetiva intensa apresentada pela
incapacidade que a moça sentia para estabelecer um vínculo afetivo
duradouro, ou seja, embora fosse inteligente bonita não conseguia
namorar ninguém. Esta frustração amorosa era o fator estressante e
de ansiedade em sua vida e que aumentava com freqüência suas crises
de transtorno de pânico. Dizia com freqüência que os homens só a
queriam como objeto sexual, e que assim que conseguiram o que
queriam caíam fora. Embora fosse bonita achava se estranha, não
desejada, apresentava auto estima baixa e medo de relacionar se por
inúmeros envolvimentos frustrados.
3) Patologias
Os processos de adoecimento que emergem a médio e longo prazo,
doenças crônicas e de longo tempo de tratamento trazem a
possibilidade do surgimento de transtornos de ansiedade e de humor.
O fato específico de ter de encarar um tratamento longo, a fraqueza,
o fato de uma aposentadoria ou invalidez, dentre outros. ex., Atendi
um senhor que tornou se deficiente visual por um acidente de
trabalho. Perdeu a visão aos 45 anos tinha vida extremamente
produtiva, alto funcionário de empresa multinacional. Era
extremamente visual e apegado as aparências do mundo. Esta reversão
em seu modo de vida brusca, afetou intensamente sua psiqué e afetos
gerando uma depressão que perdurava por 5 anos. Isolou se do mundo,
dos amigos, da sociedade, foi aposentado por depressão e invalidez,
e agora vegetava em seu apartamento. A identidade que tinha de si
mesmo após o acidente mudara. Passou a ser uma pessoa amarga,
apática, irritadiça e revoltada. A esposa o amava muito e agüentava
as duras penas a revolta do marido e sua agressividade.
Tratamento em psicoterapia é um dos fatores que devemos destacar
para a prevenção e tratamento dos transtornos de ansiedade e de
humor. Tanto para melhorar a afetividade quanto para uma
reelaboração de toda psiqué.
Hoje em dia existe a mistificação de que todo psicólogo pode e está
habilitado a fazer psicoterapia o que é um engano. A psicologia é
uma formação básica que implica na necessidade posterior do
profissional de se aprimorar. No caso de transtornos de ansiedade e
de humor não basta apenas o domínio de uma técnica mas uma formação
não cartesiana, ou seja de base humanista voltada a saúde mental e
as psicopatologias. Isto visando um bom prognóstico e até mesmo a
possível cura destes pacientes.
As formas de atuação podem ser individual e de grupo, em nossa
sistematização utilizamos ambas ao mesmo tempo o que facilita todo
nosso trabalho.
As formas técnicas utilizadas: regressão, hipnose, terapia
cognitiva, testes, ou qualquer outra ferramenta de trabalho emergirá
de acordo com a formação do profissional sendo que o indicado é um
leque maior de possibilidades também ampliando as possibilidades de
melhora do paciente.
Jorge Antônio Monteiro de Lima é pesquisador em saúde mental,
Psicólogo e musico Consultor de Recursos Humanos Consultoria para
projetos de acessibilidade para pessoas com necessidades especiais
email: contato@olhosalma.com.br - site:www.olhosalma.com.br