Autoconhecimento é fundamental para se relacionar
Por Rosemeire Zago
06/03/2010
As relações em geral são sempre motivo de queixas e uma das mais
frequentes é o modo pelo qual somos tratados, independente dos
motivos. A frase: O oposto do amor não é o ódio, é a indiferença de
Érico Veríssimo, nos faz lembrar em como as pessoas tratam com
indiferença aqueles com quem convivem e dizem amar. Não, com certeza
isso não é amor! Algumas pessoas entram na vida de outras e fazem um
verdadeiro estrago... e sequer demonstram arrependimento, sequer
voltam para pedir desculpas ou saber como você está se sentindo.
Quem já foi alvo da indiferença sabe a dor e o estrago que causa, e
sabe também que os cacos serão um a um recolhidos, mas até isso
acontecer quanto sofrimento provoca... E quem causou isso continua a
vida, muitas vezes sem sentir o mínimo de dor, ao menos
aparentemente, e vai machucando outros por onde passa.
Claro que um relacionamento afetivo tem sua base e suas
peculiaridades, e se um faz algo, foi porque o outro permitiu; mas a
verdade é que quem não está bem consigo mesmo, deveria no mínimo ter
a responsabilidade de não se envolver com outra pessoa. Sim, muitas
pessoas não têm a percepção de não estar bem, e quando se
relacionam, o outro muitas vezes funciona como um verdadeiro
espelho, ou seja, aquilo que não vê em si mesmo, projeta no outro,
acreditando verdadeiramente que não lhe pertence. Usa o outro como
espelho, sempre com o dedo acusador, sem se dar conta de que apenas
está projetando no outro tudo que não consegue –ou não quer–
enxergar em si mesmo.
É importante pensar ainda que se envolver para um pode não ter o
mesmo significado para o outro, pois a maioria apenas mantém
relações superficiais. Enfim, as variáveis são muitas, o que não nos
impede de refletir sobre as possíveis causas e suas consequências, e
assim ficarmos mais atentos na próxima relação. Afinal, os erros e
as experiências são para aprendermos. Portanto, cabe a quem conhece
esse processo não cair em tal cilada.
As pessoas estão tão alienadas de si mesmas, vivendo tão na
superficialidade, que se esquecem de valores básicos como educação
e, acima de tudo, respeito. Mas como podem se preocupar com o que o
outro sente se não identificam nem aquilo que está bem dentro de si
mesmo? Como respeitar os sentimentos do outro, se não respeitam nem
os próprios sentimentos? Diante de tantos desencontros, como se
envolver, verdadeiramente, sem se machucar?
Sim, o outro machucou, e nós, por vários motivos, conscientes ou
não, permitimos, consentimos, nos iludimos, criamos expectativas, e
ainda não consideramos vários sinais, sutis ou evidentes e o
resultado disso tudo é um só: dor, dor e mais dor! Muitas vezes
fazemos muito, cedemos muito, com a intenção que a relação dê certo;
esperamos que dessa vez fosse diferente, mas não é!
Decepcionamo-nos. E talvez se decepcionem conosco. Seja qual for a
realidade, todos podemos aprender com tudo que acontece. Mas só
aprende quem quer, quem deseja crescer, evoluir, e está aberto para
perceber quanto o autoconhecimento é fundamental, do contrário
situação semelhante voltará a acontecer, tanto para quem machucou
como para quem foi machucado.
Ficar apontando o dedo, criticando, julgando, só demonstra o quanto
não se consegue olhar para dentro de si. Não é nada fácil ter a
coragem para enfrentar um processo de análise, o qual tem como
objetivo principal o autoconhecimento, por isso é muito mais fácil
apontar o que o outro, supostamente, fez de errado. Propor-se e se
comprometer a ficar toda semana sentado por uma hora, durante um
período indeterminado, para se encontrar consigo mesmo, e assim
buscar a origem de seus conflitos, identificar suas máscaras,
entender os motivos de seus comportamentos, encontrar sua verdadeira
essência, realmente não é para qualquer um!
Muitas vezes, quem nunca passou pelo processo, acusa o outro por
todas as dificuldades encontradas no relacionamento, e se esse
também não se conhece, facilmente irá assumir toda a culpa pelo que
não deu certo. Isso acontece mais frequentemente nas relações
afetivas, mas também encontramos conflitos por falta de
autoconhecimento nas relações de amizade, familiar e profissional.
Autoconhecimento deveria ser condição básica para qualquer tipo de
relacionamento. Já dizia Sócrates: Conhece-te a ti mesmo, e eu
acrescentaria: ... antes de se envolver emocionalmente com outra
pessoa.
Quando uma pessoa -eu, você-, pretende, quer ou começa a se envolver
com alguém, deve sim ter a responsabilidade de estar bem consigo
mesmo para não jogar todos seus lixos no outro, pois é isso que
acontece quando não se conhece a si próprios. Ninguém tem a
responsabilidade de salvar, suprir necessidades emocionais do
passado, ou mudar o histórico de vida de ninguém, pois isso é
impossível, mas também ninguém tem o direito de piorar aquilo que já
foi ou é tão difícil de ser superado. Ainda que a pessoa não saiba
nada sobre o passado e as necessidades do outro, deve respeitá-lo
acima de tudo como ser humano e lembrar que todos têm um histórico,
uns mais difíceis de serem superados, outros menos.
As pessoas sequer têm consciência de suas necessidades emocionais,
as quais dão origem às máscaras, e saem em busca de quem as salve,
quando elas mesmas não conseguem se salvar. Complicado? Pode
parecer, mas não é. Todos nós utilizamos máscaras, pois é um
processo inconsciente como proteção e defesa da dor, mas sem
autoconhecimento vivemos como se essas máscaras fossem nossa
essência, o que não é verdade, pois nossa essência está escondida, e
só a descobrimos quando nos dispomos a nos conhecer. Diante desse
quadro a maioria dos relacionamentos envolve apenas mascarados. Eu
uso minhas máscaras (das quais sequer tenho conhecimento), você
utiliza as suas, e o conflito se instala. E o amor só pode ser
realmente sentido quando duas essências se encontram, é essa a
grande diferença!
Num encontro de duas pessoas que estejam abertas para evoluir, há
sempre a oportunidade de ambos aprenderem um com o outro e
crescerem. Uma relação é feita a dois, cuja base é a troca... de
afeto, carinho, atenção, amizade, cumplicidade, respeito, verdade,
fidelidade, amor! E quando não se está preparado para tal troca e
crescimento, é muito melhor encontrar-se antes consigo mesmo para só
depois se permitir encontrar-se com o outro.
Rosemeire Zago é psicóloga clínica, com abordagem junguiana e
especialização em Psicossomática. Desenvolve o autoconhecimento
através de técnicas de relaxamento, interpretação de sonhos,
importância das coincidências significativas, mensagens e sinais na
vida de cada um, promovendo também o reencontro com a criança
interior. Email: r.zago@uol.com.br