Autoconhecimento é o melhor caminho para equilibrar a relação
Por Rosemeire Zago
06/03/2010
Quando seu parceiro lhe pergunta: Em qual lugar você quer ir? O que
gostaria de comer? Para aonde iremos viajar? Qual é sua resposta?
Quantas vezes diante de tais perguntas recebemos ou damos como
resposta: “você é quem sabe”.
Isso me faz lembrar a história de um homem cuja esposa e filhos
haviam ido viajar e, estando ele sozinho, foi comprar uma pizza.
Qual não foi sua surpresa ao chegar na pizzaria não conseguia saber
qual o sabor da pizza que gostaria de comer.
Numa relação existe limite para ceder e decidir
Pode parecer absurdo, mas isso acontece. É tão comum algumas pessoas
cederem em tudo que querem, que com o passar do tempo, acabam
perdendo seus referenciais internos, até no sabor da pizza que irão
comer. Quem ganha com isso? Ninguém. Pois por um lado temos alguém
que está constantemente cedendo, muitas vezes sem perceber, e quase
sempre para agradar ao outro.
Mas com o tempo, as insatisfações irão se somando, até se tornarem
insuportáveis. Por outro lado, temos a outra pessoa que com o tempo
se sentirá sobrecarregada em ter que decidir sempre, podendo ainda
interpretar a necessidade do outro em agradá-la não como um carinho,
mas como total indiferença, parecendo que tanto faz ser de um jeito
ou de outro. Com qual papel você se identifica? Naquele que está
sempre cedendo, ou naquele que está sempre decidindo pelos dois? É
claro que os relacionamentos requerem concessões, mas em tudo há um
limite para agradar a quem amamos e convivemos, principalmente
quando isso requer ignorar os próprios valores.
Há pessoas que tem tanta necessidade em agradar ao outro, que nem se
importa no quanto desagradam a si mesmas. Passam a agir assim com
tanta freqüência e naturalidade, que quando se dão conta, percebem
que não sabem quem são e nem o que desejam para si. É evidente que é
preciso agradar ao outro, ceder, mas em tudo é necessário
equilíbrio. É muito diferente fazer algo que agrade ao outro tanto
quanto a si mesmo, do que sempre fazer algo apenas para o outro e
pelo outro. Se alguém se perde de si mesmo, como irá evitar se
perder do outro?
Mas o que faz uma pessoa se perder de si mesma no decorrer de um
relacionamento? Quando conhecemos uma pessoa e iniciamos um
relacionamento, é comum cada um querer mostrar o melhor de si. A
fase da conquista é recheada de mistérios, sedução, desejos, enfim,
mesmo sem perceber, tendemos a mostrar o melhor que há dentro de
nós. Depois os anos vão passando, a rotina toma conta, o
relacionamento vai ficando mais sério, há a união, e aos poucos
parece que aquela pessoa que tanto admirávamos, não existe mais. Nos
perguntamos se fomos enganados, traídos, se vimos mais do que a
realidade. Creio que acontece um pouco de tudo isso, pois com muita
freqüência idealizamos e nos iludimos.
Mas não podemos negar que apenas com a convivência diária, morando
juntos, é que conseguimos perceber características que não
percebemos na fase do namoro, quando após uma briga cada um vai para
sua casa e depois que a raiva passa, tudo se torna mais claro, a
saudade bate e a paz volta a reinar. Tudo é mais suportável e
superado quando se tem um tempo para esfriar a cabeça e sentir
saudade. Mas não é só isso, enquanto não há a convivência diária e
todos os problemas que a rotina acarreta, as máscaras que todos nós
usamos para nos proteger são mantidas. Mas na intimidade do
dia-a-dia, quando estamos muito mais propensos a expor nossas
fraquezas, medos, inseguranças... Ou seja, quando nos mostramos sem
nossas máscaras, o conflito pode surgir, pois o outro não sabe lidar
com aspectos que muitas vezes nem nós mesmos conhecíamos.
Todos nós usamos máscaras, elas são necessárias e surgem ainda na
infância como mecanismos de proteção. Com a convivência essas
máscaras tendem a cair, principalmente em situações de conflitos,
onde nossa parte negativa, que Jung chama de 'sombra', tende a
aparecer e se fazer presente. Se a própria pessoa não tem
consciência de sua existência, tudo tende a ficar mais difícil.
Aquela pessoa com quem você conviveu por anos de repente pode ter
reações diferentes das que você estava acostumado. Quantas vezes não
insistimos em ver a pessoa que gostaríamos que ela fosse e negamos
ou sequer permitimos que ela seja quem é na verdade. Se antes era
uma pessoa calma, carinhosa, tranqüila, compreensiva, poderá
demonstrar ser uma pessoa agressiva, distante. Com isso pensamos que
estamos nos decepcionando, que fomos enganados, quando na verdade
estávamos apenas conhecendo uma parte da pessoa, aquela parte que
fazia de tudo para conseguir suprir necessidades muitas vezes
inconscientes. Afinal, qual é sua máscara e qual é sua essência, seu
eu verdadeiro? Com quem estamos nos relacionando?
É importante considerarmos também nossas expectativas, ilusões e
idealizações em relação a pessoa com quem convivemos. Será que
muitas vezes não desprezamos ou controlamos tanto que não permitimos
que o outro seja ele mesmo? Quantas vezes não ficamos na expectativa
que o outro se torne a pessoa que gostaríamos que fosse e ignoramos
sua verdadeira essência, assim como suas necessidades mais
profundas?
Esperamos mudanças, acreditamos nas promessas, mas nos decepcionamos
e nos machucamos quando as promessas ficam apenas nas palavras, sem
atitudes que demonstrem a verdadeira mudança. Nos perguntamos se
fomos traídos. Podemos ser traídos, mas creio que muito mais em
nossas próprias expectativas e ilusões, as quais deixamos que
tomassem conta de nossos sentimentos. Aos poucos as pessoas se
mostram realmente como são e nós, com nossas idealizações e
esperanças sem fim, ignoramos sinais evidentes.
Claro que todos nós erramos, mas quando o amor se demonstra em
humildade, sem arrogância e orgulho, não só com um pedido de
desculpas, mas demonstrando verdadeiramente o arrependimento em
atitudes, por vezes conseguimos relevar e continuar adiante, mas nem
sempre o sentimento consegue sobreviver a traições, mentiras,
decepções, indiferença, desprezo, mágoas, que aos poucos vão se
acumulando e comprometendo o amor.
Quando apenas um dos dois insiste no crescimento de relação, que
envolve mudanças, comprometimento, responsabilidades, cuidado,
atenção, respeito, os dois acabam por se machucar, pois dificilmente
apenas um consegue manter o relacionamento de maneira saudável. É
preciso que ambos se conscientizem que é preciso um comprometimento
na melhora do relacionamento e para isso é preciso muito, muito
diálogo.
As pessoas estão muito distantes do ideal de relacionamento, pois
para que esse ideal seja alcançado, se é que ele existe, é
necessário maturidade emocional, que se alcança com o
autoconhecimento. Quando uma pessoa não se conhece, como poderá
conhecer ao outro? Enquanto cada um continuar com medo de olhar para
dentro de si mesmo, também não conseguirá enxergar o que o outro tem
de melhor, permanecendo na ilusão e em conseqüência, na frustração.
Todas as ilusões deste mundo são pequenas se comparadas às que
infligimos a nós mesmos durante nossa vida. Sermos honestos acerca
de nós mesmos é um dos maiores desafios que temos de enfrentar. É
por isso que o autoconhecimento tem sido considerado a missão mais
difícil e importante por todos que estão em busca da verdade. E para
que um relacionamento sobreviva e cresça é preciso muita honestidade
de ambos em busca da verdadeira essência que se chama amor.
Rosemeire Zago é psicóloga clínica, com abordagem junguiana e
especialização em Psicossomática. Desenvolve o autoconhecimento
através de técnicas de relaxamento, interpretação de sonhos,
importância das coincidências significativas, mensagens e sinais na
vida de cada um, promovendo também o reencontro com a criança
interior. Email: r.zago@uol.com.br