Como Educar nos dias de hoje?
Por Sirley Bittú
14/07/2003
Educar é um assunto corrente em consultório de psicologia. A
necessidade de colocar limites é sempre muito questionada, tanto
pelos filhos como entre os novos e dedicados pais. Muitas pessoas
viveram em sua própria educação a experiência de duros limites,
constituídos em regras e proibições. Autoridade era misturada com
Autoritarismo, a sabedoria da maturidade era confundida com verdade
absoluta. Exigia-se da criança, do adolescente e mesmo dos adultos,
total submissão e resignação; ser uma criança boazinha era sinônimo
de atender as regras, jamais ser espontânea e nunca criar ou
questionar algo; a liberdade em expressar suas idéias e pontos de
vista confundia-se com enfrentamento e desrespeito aos mais velhos.
É claro que esse modelo de educação trouxe muitos problemas e
resultou em muitos adultos inseguros e até mesmo revoltados. Neste
quadro surge uma postura defendida pelos psicólogos e estudantes do
comportamento humano que talvez não tenha sido suficientemente
entendida. A proposta era possibilitar a livre expressão dos
potenciais e da espontaneidade infantil, como até hoje defendemos.
Respeitar a criança em seus desejos e necessidades esperadas para a
idade, por exemplo, a curiosidade perante o novo, a inesgotável
energia de vida, sua necessidade de brindar para entender o mundo e
etc... Mas para alguns pais essa proposta foi confundida com a total
permissividade, a educação do tudo pode, perdendo o entendimento da
palavra não, do limite e do respeito.
Nascemos totalmente espontâneos e criativos e com o decorrer do
desenvolvimento através da educação aprendemos como usar nossos
potenciais adequadamente, ou seja, respeitando as regras para viver
socialmente. É também neste processo que aprendemos a acreditar ou
não nesses potenciais. Nossas atitudes e comportamentos são o tempo
todo avaliados e confirmados ou não, pelas pessoas com quem nos
relacionamos e principalmente pelos nossos pais. É desta aprovação
que surge a sensação de segurança interna que todos possuímos em
maior ou menor quantidade, e também nossa auto-estima. É claro que
para os pais não é uma tarefa fácil, pois implica em ter uma noção
clara do que é ser adequado, o que depende de sua maturidade
emocional.
Há 40 anos atrás questionar uma ordem paterna, por mais absurda que
ela fosse era praticamente um crime, castigável sem sombra de
dúvida, com diversas formas de agressão tanto físicas como
emocionais. Hoje em dia o questionamento já começa a ser entendido
como algo positivo, pois ao trazer questionamentos novos a questões
antigas aumentam-se as possibilidades de criar e descobrem-se novas
formas de existir. O conhecimento deixa de ser percebido como uma
conserva cultural e passa a ser percebido como algo dinâmico e em
constante transformação e renovação.
Mas como oferecer liberdade sem tornar a sociedade um caos?
Introduzindo as noções de responsabilidade e respeito. Quando
falamos em liberdade, falamos em respeito ao outro e em respeito a
si mesmo, caso contrário estamos falando em invasão, e em
desrespeito. Para convivermos em sociedade precisamos de algo que
nos auxilie a lidar com as diferenças entre as pessoas, suas
particularidades na sua forma de existir e de entender o mundo, pois
apesar de sermos todos humanos, e similares em nossas necessidades,
a forma de expressar nossos desejos difere de um para o outro, pois
se relaciona ao grau de maturidade de cada um.
É como se todos nós usássemos óculos relacionais, onde as lentes são
forjadas durante a aprendizagem emocional, por crenças, valores e
pontos de vista. Isto se explica por termos potenciais inatos que
são influenciados pelo meio social em qual nos desenvolvemos. Esta
delicada alquimia é responsável pelos diferentes tipos de pessoas em
que nos tornamos. Portanto para vivermos socialmente necessitamos de
alguns parâmetros, que se traduzem nas noções de ética, cidadania,
gratidão e senso moral. Desta forma, quando pensamos em educar,
precisamos checar dentro de nós como nos posicionamos em relação a
isto e como esses parâmetros estão sendo exercitados nas relações
que desenvolvemos.
A educação se constitui basicamente em aquilo que dizemos,
confrontados pelo que fazemos. Ou seja, se pregamos o respeito mútuo
e a honestidade, mas no dia-a-dia, valorizamos o esperto, aquele que
sempre se dá bem, estamos sendo incoerentes e certamente essa
incoerência fará parte de nosso rol de ensinamentos, seja de forma
consciente ou inconsciente.
O catalisador necessário ao processo de educação é o amor. Este gera
a segurança interna, a confiança e a respeitabilidade, ingredientes
indispensáveis para que a relação de intimidade necessária num
processo de educação possa se estabelecer. Educar implica em
intimidade, e você só ensina algo se é autorizado pelo outro, com
esta autorização que se dá pela confiança que nasce nas relações
onde o amor e a amizade são as palavras de ordem.
Muitos pais se referem frequentemente às dificuldades em colocar
limites, confusos entre cercear demais ou de menos. Esta dificuldade
nasce de uma forma de entender o amor muitas vezes equivocada, onde
se confunde limite com abandono e desamor, e consequentemente amar
torna-se sinônimo de total permissividade, com a antítese do nada
pode passando a ser o pode-se tudo.
Colocar limites é ensinar que existe a frustração, que apesar de
desagradável, faz parte do mudo real, ao vivo e a cores. O limite
nos ajuda a perceber quem somos, o respeito nos ensina que temos
limites e aumenta nossa consciência pessoal, e a responsabilidade
nos ensina que tudo tem seu preço, pois estamos sempre em relações
de troca, colhendo aquilo que semeamos. Oferecendo amor certamente
colheremos alegria e felicidade. Para exercer o papel de educador,
precisamos reavaliar o entendimento do "não", para esta importante
palavra não se transformar numa forma de tirania e sim uma forma de
proteção, exercício do amor e respeito a quem amamos.
Psicodramatista Didata Supervisora
Terapeuta em EMDR pelo EMDR Institute/EUA
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