Função do Ego no Aparelho Psíquico
Por Márcia Vasconcellos de Lima e Silva
1998
Em 1900, no livro "A Interpretação dos Sonhos", Freud fez sua
primeira tentativa de construir o que poderia ser um modelo do
aparelho psíquico. Assim, Freud descreveu o aparelho psíquico em
dois sistemas : o preceptivo e o motor. Entre ambos haveria uma
quantidade ( quantum ) de energia psíquica que circularia de um
sistema para outro pelos traços mnêmicos. Este poderia ser
considerado um percurso energético na busca do objeto perdido.
Em 1915, Freud construiu um segundo modelo teórico no qual dividiu o
aparelho psíquico em três sistemas mentais : Inconsciente (Ics); Pré
- Consciente (Pcs) e Consciente (Cs). Posteriormente, denominou esta
formulação de divisão topográfica. Esta ficou sendo conhecida como a
primeira tópica.
Enquanto Freud estudava o Inconsciente, dando-se conta de sua
complexidade, em 1923, formulou uma nova hipótese acerca do aparelho
psíquico - a hipótese estrutural - que divide aquele em três
estruturas ou instâncias psíquicas às quais denominou ID; EGO e
SUPEREGO. Sendo o ID considerado a instância psíquica conhecida por
" princípio do prazer " e o EGO, " princípio da realidade ". Esta
hipótese ficou sendo conhecida como a segunda tópica.
Porque relacionar o EGO ao chamado princípio da realidade? Porque
cabe a ele, a partir da realidade interna - referente às exigências
do id de um lado e do superego do outro - e da realidade externa
tentar conciliar da melhor forma possível esses dois "mundos", a fim
de satisfazer as necessidades do id e as exigências do superego de
acordo com as reais possibilidades. Desta forma, conclui-se que uma
das principais funções do EGO é a de manter a homeostase
(equilíbrio) do aparelho psíquico.
Inúmeras são as funções do EGO, tais como a aquisição do controle
motor, a questão da percepção sensorial e sua ligação direta com o
meio ambiente (ou realidade externa), todos os aspectos relacionados
à memória (armazenamento de experiências, lembranças), etc.
O EGO tem, ainda, por função a criação dos mecanismos de defesa
(aspecto inconsciente do EGO). São eles: projeção, introjeção,
formação reativa, cisão, racionalização, regressão, negação e
outros.
Penso ser interessante e oportuno fazer uma breve distinção entre as
posições de Freud e a Psicanálise e as concepções de Anna Freud e a
Psicologia do Ego no que diz respeito ao EGO e suas funções - tema
do presente trabalho.
Anna Freud foi uma das principais líderes do movimento neofreudiano
denominado de Psicologia do Ego. Os annafreudianos - como ficaram
sendo chamados - aceitam as premissas/pressupostos básicos da
Psicanálise e, ao longo dos anos, apenas modificaram e/ou ampliaram
alguns de seus aspectos da teoria e da técnica psicanalítica
tradicional.
Sua principal modificação é a que se refere a uma visão mais
ampliada do EGO. Por esta visão, o ego possui energia própria, tem
funções distintas das do id chegando a ser até mais independente do
que este.
Tudo isto constitui um significativo afastamento do pensamento
original de Freud no qual o ego nunca estava livre das demandas do
id. Segundo a Psicologia do Ego, este não só deixa de ser
considerado como uma estrutura escravizada pelo id, mas se apresenta
até mais independente do que o id.. E no dizer de Freud: "O ego não
é senhor nem em sua própria casa".
Os annafreudianos ou psicólogos do Ego introduziram outras mudanças
interessantes, tais como, a diminuição da importância relegada à
sexualidade infantil e ao Complexo de Édipo - sugerindo que o
desenvolvimento da personalidade deve-se muito mais a forças
psicossociais do que psicossexuais. Diferem, ainda, de Freud quando
remetem tudo à trama edípica e trabalham as defesas, as resistências
e as identificações.