Psicologia Clínica e Psicologia Hospitalar: Considerações Iniciais
Por Márcia Vasconcellos de Lima e Silva
2001

Este tema pretende abordar, num primeiro momento, algumas questões acerca da prática da Psicologia Clínica em hospitais. Jamais proponho-me aqui a esgotar o assunto mas, pelo contrário, suscitar discussão e reflexão.
Algumas questões surgem quando se trata de considerar a utilização da Psicologia cujo referencial é a clínica no contexto de atuação em um Hospital. A partir daí, podemos nos indagar acerca do porquê desta opção em relação à atuação de psicólogos que trabalham em empresas, escolas, etc.
Da mesma forma, pode-se ficar intrigado com, uma vez tendo-se aceitado ou definido a Psicologia Clínica como protótipo de uma área da Psicologia que mais ou melhor se adequa ao trabalho em hospital, a questão que se segue é a de qual abordagem teórica deve ou não ser utilizada.
Vejamos por partes. Nunca se disse, não que eu saiba ou tenha lido, que a Psicologia Hospitalar somente pode ser praticada por psicólogos que tenham experiência clínica. Porém, no meu entender e experiência em consultório e, recentemente (cinco meses) em hospital, posso observar que a intervenção de um psicólogo clínico é completamente diferente da que seria feita por um psicólogo que trabalha em outras áreas da Psicologia.
Estou apontando para o que se chama, a escuta clínica. E esta só se desenvolve a partir de uma crescente experiência clínica. Desta forma, as intervenções realizadas em pacientes hospitalizados ou que transitam por hospitais tornam-se beneficiadas por essa acuidade clínica e, portanto, são mais efetivas, eficientes e eficazes.
Qualquer psicólogo pode (e deve) trabalhar em hospital - experiência riquíssima em vários aspectos. Porém, aqueles que já vêm com uma bagagem clínica estão mais aptos a, num primeiro momento, realizar um trabalho mais condizente com o que se espera num hospital da equipe de Psicologia.
Outro ponto a ser considerado é aquele que diz respeito às diversas abordagens teóricas que o psicólogo pode se utilizar. Ou seja, qual o referencial teórico que norteará e fundamentará seu trabalho no hospital.
Há que se considerar que o trabalho desenvolvido em hospital deve ser o mais flexível possível. Assim, a teoria, e isso eu afirmo tanto para a prática em consultório quanto para o trabalho em hospital, deve servir sempre como um guia e não um dogma.
A Psicologia nos oferece várias possibilidades de enfoque em termos de abordagem terapêutica. Porém, o profissional cujo referencial é rígido torna-se inapto a desenvolver um trabalho de qualidade e de efetiva ajuda ao paciente - onde quer que seja.
É comum as pessoas indagarem se é possível utilizar a Psicanálise em um contexto hospitalar. Ao que eu respondo que sim, porém, de um modo muito específico e característico, qual seja: a de que não se pratica a Psicanálise em si, mas a escuta analítica do inconsciente, as fantasias subjacentes à doença, o imaginário por detrás dos sintomas orgânicos, os ganhos secundários provenientes da internação, etc.
Ou seja, a técnica não deve ser a da Psicanálise, mas o embasamento e a coerência do trabalho a ser desenvolvido pode estar fundamentado na teoria e pressupostos psicanalíticos, se for o caso.
Utilizei-me da Psicanálise por observar que é a abordagem que mais gera polêmica, não desmerecendo, absolutamente, as outras das quais inclusive faço uso quando necessário.
Enfim, tanto no consultório quanto no hospital a atuação do psicólogo deve ser tão flexível e coerente com a sua crença (convicção teórica), práxis e a demanda do paciente e/ou a realidade hospitalar quanto possível.

Sugestões Bibliográficas

Angerami-Camon, V. A (org.). E a Psicologia entrou no hospital... Pioneira, São Paulo, 1996.
Oliveira, M. F. P. & Ismael, S. M.C. (org.). Rumos da Psicologia Hospitalar em Cardiologia. Papirus Editora, São Paulo, 1995.
Rezende, V. L. (org.). Reflexões sobre a vida e a morte - abordagem interdisciplinar do paciente terminal. Editora da UNICAMP, São Paulo, 2000.
Romano, B. W. Princípios para a prática da Psicologia clínica em hospitais. Casa do Psicólogo, São Paulo, 1999.