O Psicólogo Organizacional e a Globalização
Por Ana Lúcia Pereira
10/06/2007
RESUMO
Neste trabalho abordamos a questão do engajamento de psicólogos
organizacionais como possíveis agentes de mudanças sociais
significativas, contradizendo as tendências que os classificam como
profissionais vendidos ao sistema e criticando a postura corrente
dos meios científico-sociais de não proporem ações alternativas aos
seu objetos de crítica.
O psicólogo organizacional é freqüentemente discriminado pelo meio
acadêmico e pelos estudantes de psicologia, por ser supostamente
conivente com práticas administrativas que nem sempre levam em
consideração as necessidades dos trabalhadores. É acusado também de
esquecer sua responsabilidade social e colaborar com a exclusão
social, com a retirada dos mecanismos de proteção ao trabalhador e
com o esmagamento da individualidade do mesmo, tudo isso em prol do
atendimento das necessidades de seu empregador.
Em função das exigências da globalização as empresas tem procurado
adaptar-se as necessidades do mercado internacional e adotado a
filosofia do “quem não almoçar será jantado”. Para atender tal
demanda, cada vez mais, novas práticas administrativas tem sido
exportadas e implantadas nas empresas, não levando, muitas vezes, em
consideração o contexto cultural e social do país. E com os
empregados o sistema não é menos impiedoso: “adapta-se ao novo
sistema ou está fora da empresa”.
Não negamos a existência de profissionais de fato pouco
comprometidos com as necessidades dos trabalhadores, porém chamamos
a atenção para o perigo de uma generalização.
Pode parecer, em um primeiro momento, um ato heróico o psicólogo
recusar-se a fazer parte de um sistema que explora o trabalhador,
sem que ao menos este tenha consciência de que está sendo explorado,
uma vez que é envolvido de tal forma pelo processo, que internaliza
como seus, os objetivos da empresa.
Afinal de contas, imagine o psicólogo, tão “boa praça”, tão engajado
com as questões sociais, concordar com um sistema que, entre outras
“atrocidades”, convence o desempregado de que se no mercado de
trabalho não existe lugar para ele, a culpa é única e exclusivamente
dele mesmo que não conseguiu contribuir com a empresa sendo um
profissional com todas os requisitos de um “super homem”:
criatividade, responsabilidade, facilidade para resolver problemas e
para trabalhar em equipe, disponibilidade para trabalhar “25” horas
por dia e, ainda assim, praticar esportes e ter uma vida social
ativa, bom humor constante e nem sinal de estresse. Isso porque
talvez não seja interessante para os detentores do poder que os
desempregados percebam que não são eles, na verdade, os grandes
responsáveis por sua situação. Que o desemprego enfrentado no Brasil
é estrutural, ou seja, conseqüência do avanço tecnológico, que foi
pouco a pouco trocando homens por máquinas. Que mesmo em países onde
a grande maioria da população é considerada suficientemente
qualificada o desemprego é presente, pois a questão é numérica:
existem mais pessoas para trabalhar que postos de trabalho
disponíveis.
Mas será que é cruzando os braços e torcendo o nariz para as
organizações e para os colegas que nelas trabalham, que os
psicólogos estarão contribuindo para a conscientização dos
trabalhadores sobre seus próprios limites, direitos e necessidades?
E mais, não estarão abrindo mão de um valioso espaço de
questionamento, que poderia contribuir para a busca de alternativas
que poderiam amenizar os transtornos da atual situação?
Será como observador passivo, em seu consultório, que o psicólogo
fará com que empregadores percebam a importância de considerar as
necessidades de seus funcionários ao estabelecer suas metas de
crescimento e lucratividade?
Será que o profissional de psicologia enquanto observador passivo, é
menos conivente com o sistema do que aquele que está na empresa
dizendo “amém” às ordens do chefe?
Acreditamos que tais perguntas deveriam servir de reflexão a todos
os psicólogos que preferem simplesmente fazer críticas não
construtivas ao psicólogo organizacional. Quanto a nós, fazemos coro
a Codo [1], quando afirma que:
“(...) o psicólogo deveria estar na indústria, refletindo
conscientemente para tentar subverter suas funções. Franzindo o
nariz e se recusando a cumprir tão “vil papel”, os defensores desse
tipo de crítica fazem coro exatamente ao sistema, pois reivindicam
pelo avesso a neutralidade da ciência, que denunciam como falsa, e
poupam os industriais do incômodo de ter entre suas fileiras um
profissional preocupado com a defesa dos direitos do trabalhador”.
Se é inevitável que a globalização traga consigo exclusão social e
prejuízo aos direitos trabalhistas, não adianta o psicólogo
simplesmente “ser contra” a globalização. Precisa sim, juntamente
com empregados e empregador, repensá-la de forma a oferecer ao
trabalhador contrapartidas que possam amenizar seus prejuízos. Mas
para que isso seja possível é necessário, antes de tudo, conhecer os
conceitos que permeiam tal prática, pois não é possível criticar e
sugerir mudanças a respeito de fatos que não dominamos. É preciso
entender a linguagem e as expectativas dos empresários sim, para a
partir delas sugerirmos mudanças que levem em consideração o bem
estar dos trabalhadores.
E será que os psicólogos, em sua formação, entram em contato com
tais conceitos? Acreditamos que na maioria das vezes não, e que isso
seja uma das falhas da formação que é oferecida em psicologia
organizacional na maioria das universidades. Contribuindo, dessa
forma, não só para a formação de profissionais menos qualificados e
com menor poder de barganha junto às organizações, como também para
a perpetuação do preconceito já existente com relação aos psicólogos
organizacionais.
Referências Bibliográficas:
[1] CODO, W. (1994). O papel do psicólogo na organização industrial
(notas sobre o “lobo mau” em psicologia.). In: LANE, Silvia T.M.;
CODO Q. (orgs.). Psicologia social: o homem em movimento. 13a ed.
São Paulo: Brasiliense.
Ana Lúcia Pereira é Psicóloga Clínica, professora Universitária e
Consultora Organizacional. Email: alp@analuciapsicologa.com -
http://www.analuciapsicologa.com