Sem Medo da Psicanálise e do Psicanalista
Por Marcus Facciollo
12/11/2009
Quantas vezes não ouço que psicanálise é coisa para gente doida,
neurótica, histérica, ou para quem é rico e não tem o que fazer,
então vai matar tempo com o analista. Que é chegar num consultório,
ficar deitado num divã, falando sem parar, com o analista longe de
seu campo de visão, ouvindo-o ou fazendo sabe-se lá o quê...
Iniciei meu atual processo de psicanálise (sim, pois já tive um
anterior) por vontade própria, num momento muito difícil de minha
vida, em que me sentia totalmente perdido, num beco sem saída, em
depressão. Creio que esse meu movimento interior de procurar um
analista e ter tido empatia imediata com ele foi muito positivo,
pois já comecei o processo com vontade e confiante que dali
resultaria algo positivo. Ter ido com boa vontade, aberto e ter
encontrado um profissional muito bom de cara foi meio caminho
andado. Mas, isso poderia não ter acontecido, eu poderia não ter
tido empatia para com ele, não ter sentido confiança para me abrir,
como aconteceu com muita gente que conheço. Aí, só posso dizer algo:
se achar que é seu momento mesmo de vivenciar um processo de
psicanálise, não desista, procure outro profissional.
Sim, porque a análise é algo muito bom. Muito! Não é coisa de doido
ou de desocupado. É um processo que o ajuda a melhorar como pessoa
para si mesmo. Você estando com o desejo de que as coisas fluam,
estando com um profissional habilitado e humano, consegue
importantes resultados positivos. Conhece-se melhor, em primeiro
lugar. Começa a discernir o que é bom ou não para você, dentro de
si, em sua vida, em seus atos, nos seus contatos pessoais. E aí vem
o amar-se melhor, respeitar-se mais, reorganizar a vida pessoal,
afetiva, social, profissional, já que você está mais próximo de si e
do que quer e precisa para estar bem. Eu considero a análise
essencialmente um processo de autoconhecimento orientado por um
profissional que o ajuda a encontrar respostas dentro de você mesmo
e quando necessário lhe dá orientações e "dicas" de como poderia
proceder de forma positiva. Analista não é milagreiro, nem dono da
verdade. Nem vai resolver seus problemas por você. Ele lhe
apresentará instrumentos para isso, muitos resgatados de dentro de
você mesmo. Portanto, a análise só dá certo quando permitimos,
colaboramos. O profissional pode ser maravilhoso, habilitado, com
uma técnica ótima, mas, se eu não quiser, a coisa não irá em frente.
Preciso colaborar. É 50% de mim, 50% dele, essa proporção oscilando
para mais ou para menos para algum dos lados em diferentes momentos.
Mas nunca será 100% de um lado e 0% do outro.
Tenho conhecimento de casos em que o psicanalista deu alta para a
pessoa depois de 3 meses de análise. Por quê? Na verdade, porque o
paciente analisado não cooperava em nada, não se abria, não permitia
que o processo acontecesse de forma alguma. Se foi correto dar alta
para esse paciente ou não, não questiono a atitude do profissional,
mas uso esse exemplo só para reforçar que se o paciente não faz a
parte dele, a coisa não vai para frente. Claro, o inverso é
verdadeiro. Se o profissional não inspira identificação, empatia e
confiança no paciente, não tem técnica, qualidade, melhor procurar
outro psicanalista, se for percebido que não existe mesmo
indisposição/resistência da parte de quem está no consultório para
ser analisado. Mas é importante não desistir da psicanálise. Ok,
também pode ser que você, como paciente, não esteja em seu momento
para começar num processo de psicanálise. Tudo bem, dê um tempo,
retorne quando achar que chegou a hora. Ou talvez seu caminho seja
outro, outro tipo de terapia, tudo bem. Mas chegue a essa conclusão
de forma sincera, não movido por resistências interiores ou
exteriores.
O psicanalista não é um Freud de charuto na mão e cara emburrada.
Pelo menos, não tem de ser assim. Há profissionais e profissionais,
que seguem diferentes linhas da psicanálise. Pode ser que ele peça
para que deite num divã e fique sentado fora de seu campo de visão,
pode ser que ele peça que sente numa poltrona de frente para ele, ou
mesmo dê a opção de escolher, se quer o divã ou a poltrona. Pode ser
que ele ouça mais e você fale mais, ou vice-versa, isso também varia
de sessão para sessão, de momento para momento. O bom profissional
saberá quando agir de uma forma ou de outra. A sessão pode ser de
grande interação entre você e ele, parecendo mesmo uma conversa, um
diálogo. Ele pode ser mais distante ou mais próximo, afetivo.
Psicanalistas são pessoas como você, com características próprias e
diferentes de um para o outro. Além de profissional, ele é um ser
humano, que também tem problemas, alegrias, ama, se frustra,
conquista. Pessoalmente, eu queria um profissional que fosse
informal, que mostrasse seu lado humano e desse opiniões como
profissional e também como pessoa, e achei. Se você quer um
profissional majoritariamente "profissional", mais técnico e
distante, também existe. Ou seja, há psicanalistas de todos os tipos
para todos os "gostos" e necessidades.
Outra coisa que se ouve muito é alguém dizer que saiu arrasado de
uma sessão de análise, que é muito difícil o processo. Algumas
sessões são mais densas que outras, mais impactantes, e podemos sair
do consultório aparentemente pior do que chegamos. É que geralmente
ficamos assim quando alguém nos diz algo que mexe com nossas
convicções, com nossos medos, traumas. Não gostamos quando alguém
nos dá uma "chamada". Mas, adiantaria se o analista ficasse o tempo
todo dizendo "amém" para o que falamos, somos e fazemos? Um amigo de
verdade muitas vezes discute com a gente para que nos melhoremos.
Assim como o bom profissional às vezes nos "repreende" quando
estamos nos fazendo ir "poço abaixo", ou dando "murros em ponta de
faca". Uma chamada à realidade, a não compactuação com uma fantasia
negativa nossa na forma de uma "bronquinha" é para o bem da gente,
para nosso crescimento e melhora.
O psicanalista não vai brigar com você se fizer algo "errado",
absurdo, infantil, não vai colocá-lo de castigo. Pode falar mais
sério e duro consigo, mas isso não significa que deseja humilhá-lo,
tratá-lo mal (se existe algum profissional que faz isso por sadismo,
é o caso de refletir, perceber se realmente é isso e procurar
outro). Quando ele o repreender, vai fazê-lo parar para pensar, cair
na realidade. Vai auxiliá-lo, depois, na busca por respostas e
atitudes positivas, dará orientações, que, se você estiver aberto
para ouvir e pensar sobre, verá que são muito úteis. Ele não irá lhe
chamar à atenção e só. Vai fazer isso e quando oportuno trabalhar
com você na busca de soluções.
Portanto, há profissionais diferentes, linhas diferentes. Haverá um
profissional com quem se identifique e uma linha de análise com a
qual isso também aconteça. Talvez o medo real não seja do analista,
nem da imagem que se faz da psicanálise, do que os outros vão dizer
quando souberem que você faz análise. O medo maior talvez seja o de
você entrar num processo que irá mexer com seus conceitos, ideias,
mitos, que o obrigará a ficar cara a cara consigo, conhecer seu
interior e reformulá-lo. Ou seja, dá medo de mexer na situação,
muitas vezes, por pior que percebamos que ela esteja. Dá medo
perceber que vivemos uma mentira, ou que fingimos ser o que não
somos, que nos machucamos por hábito ou nos vitimizamos para chamar
a atenção, daí vai. Conhecer-se de verdade pode ser amedrontador.
Mas, na psicanálise, isso é feito dentro do seu tempo e dos seus
limites, não precisa ser uma "terapia de choque". E é feito para seu
benefício. Vale a pena enfrentar esse medinho e tentar, se perceber
que quer, que chegou a hora. Os resultados positivos, quando começam
a aparecer e ser percebidos, valem o esforço.
Cuidemos de nossas próprias vidas. Vamos atrás do que pode ser bom
para nós, mesmo que possa parecer desgastante no começo, mesmo que
fantasiemos que será difícil. Se não for bom, você poderá parar e
retomar depois, de forma diferente, se quiser. Só não se impeça de
começar por medos infundados ou por ignorância em relação à coisa.
Converse com quem faz, colha informações, impressões, leia sobre,
reflita, se desejar, antes de partir para a ação, no caso, a
psicanálise. Quando sentir que pode ser o momento, vá. Arrisque-se.
A chance de valer muito a pena, de ser muito bom, é bastante grande!
Sem se preocupar quanto tempo demorará o processo, quando terá alta,
etc., de repente pode se tornar algo tão positivo para você que a
análise será por tempo indefinido. Vá sem autocobrança. Encare seu
medo e dê um voto de confiança e disposição para que aconteça.
Repito, o retorno poderá ser muito bom!
Marcus Facciollo, Desde 1994, vem investindo no crescimento pessoal,
autoconhecimento e melhor entendimento da vida e do ser humano, seja
por meio de cursos (como os da Fundação ACL) ou de (auto)análise.
Desde criança, tem vocação para escrever e para o mundo das letras,
área na qual é formado. Trabalha atualmente como revisor de textos e
publica textos de sua autoria nas áreas de comportamento humano,
relacionamentos e autoconhecimento. Autor, com Sérgio Fernandes, do
livro "A vida pode ser mais leve - conheça-se e seja mais feliz":
www.avidapodesermaisleve.com.br