A Sexualidade de cada um
Por Sirley Bittú
04/11/2002
Vamos fazer um rápido exercício: Pense por um instante nas formas de
expressar carinho, amor, desejo, excitação, que você já presenciou.
Deixe as cenas brotarem de sua memória, sua família seus pais, você
mesmo, como acontecia? Seus pais se beijavam na sua frente? Trocavam
carícias, andavam de mãos dadas, lado a lado ou um na frente outro
atrás? Conversavam sobre sexo, amor, carinho com você? Censuravam
filmes, horários de TV? Reagiam com vergonha ou com naturalidade às
suas perguntas? Estavam presentes...
Agora lembre-se de como você lidava com tudo isso, você era tímido,
ousado, curioso? Tinha medo de fazer perguntas ou
não?...contentava-se com qualquer resposta? Conversava com
amigos(as) sobre suas dúvidas? Por último, tente detectar a
influência de tudo isso em sua sexualidade hoje.
Entendo que trata-se de uma tarefa ampla para ser feita num breve
instante, e obviamente não coloquei aqui todas as variáveis que
deveríamos considerar, mas é apenas o início de um exercício que
poderá ajudá-lo a compreender a influência de nossas experiências em
nosso comportamento, principalmente na expressão de nossos
sentimentos.
Hoje a expressão de sua sexualidade com alta chance é o resultado
dessa difícil e complexa equação: tudo que recebeu de informação -
conceitos e preconceitos, mitos e verdades - somados à sua forma
particular de decodificar aquilo que recebeu: seu óculos.
A escolha sexual passa por um processo físico, emocional e social.
Como podemos perceber, recebemos modelos de comportamento em nossa
educação e nascemos com características particulares. Aprendemos a
nos vestir, a nos movimentar de forma adequada, ou esperada
socialmente, a escolher o que comer, a torcer por um time, ou um
esporte, a gostar de TV ou não. Tudo isso de forma explícita ou nem
tanto, dependendo do grau de consciência dos educadores que cada um
de nós teve. Da mesma forma aprendemos a lidar com nossa
sexualidade.
Nossos envolvimentos amorosos passam por nossas buscas,
insatisfações, fantasias, crenças, medos, certezas e entendimentos
de mundo. O ser humano naturalmente busca se envolver afetivamente e
amorosamente. A demanda do ser humano é uma demanda de amor, o
prazer, o carinho, fazem parte desta esfera. O tipo de parceiro(a)
que escolhemos está relacionado a esses modelos que recebemos
durante nosso desenvolvimento, às pessoas que conhecemos, e
histórias que acompanhamos.
As formas que buscamos para obter prazer relacionam-se a nossas
fantasias, desejos, e às possibilidades de realizá-los. O ser humano
é um complexo formado por razão, emoção e espiritualidade. O desejo
é livre, podemos desejar muitas coisas, mas a execução desses
desejos passa pelo crivo da nossa razão e espiritualidade. O que
quero dizer é que desejar é expressão do humano que existe em nós,
mas executar o desejo é expressão de nossa saúde interna, de nossa
capacidade de adequação, ou habilidade para viver socialmente, e de
nosso entendimento de mundo.
Durante o desenvolvimento pessoal temos a difícil tarefa de aprender
a respeitar nossos valores, a sermos espontâneos em nossos desejos e
criativos, procurando o caminho para superar nossas limitações.
Difícil também é detectar nossos desejos. Os desejos enquanto
substância humana são a expressão de nossa individualidade.
Ainda temos muitos preconceitos mesmo nos dias de hoje. A
homossexualidade por exemplo ainda é alvo de ataques e desrespeito.
A liberdade de escolher e de ser o que se deseja ainda está longe de
ser conquistada, ainda há de se crescer muito e amadurecer nosso
modo de nos relacionar com aqueles que pensam, sentem e percebem o
mundo de maneira particular e diferente de nós.
A virgindade hoje em dia tornou-se um tabu ao contrário, entre os
jovens. O crime agora é ser virgem e não mais não ser como 40 ou 50
anos atrás; apenas se inverteu a posição, portanto o preconceito
ainda impera absoluto.
A virgindade não é apenas uma questão de transar ou não, mas está
diretamente relacionada à noção de respeito próprio, capacidade para
cuidar de si e responsabilidade. O jovem estará preparado quando a
relação sexual não for uma obrigatoriedade ou apenas mais uma
afronta.
É comum escutar frases do tipo ...todas as minhas amigas da minha
idade já transaram... ou, quando alguém me pergunta, eu vou logo
dizendo que é claro que já tive a minha experiência... ou, sou
chamada de ‘vacilona’ porque não quis transar ainda...
Este é um importante aprendizado emocional: assumir nossas escolhas
e bancar suas conseqüências.
A noção de respeito e individualidade ainda é muito confusa
socialmente. No Brasil a sexualidade é algo explorado e produto da
mídia, somos o país das mulatas e dos biquínis. As crianças são
estimuladas através das roupas, acessórios, TV, músicas e até
algumas danças, a voltarem sua atenção para a sexualidade, algumas
vezes perdendo com isso seu espaço de serem crianças, simplesmente
porque a sexualidade faz parte do mundo do jovem/adulto e não da
infância.
Comerciais de TV aludem à sexualidade, mulheres são associadas a
cervejas ou ao prazer provocado por elas. A mídia é a expressão do
imaginário humano, refletindo idéias, valores, desejos e fantasias
da atualidade. A mulher como objeto sexual ainda vende, mas o homem
também passou a ser produto de consumo.
Estamos numa época de reformulação de valores, idéias e crenças. O
ser humano está sempre em evolução e transformação. Nossos
entendimentos de bom e mau, certo e errado modificam-se de acordo
com o prisma que escolhemos para decodificar a vida.
A sexualidade deve ser olhada e aceita como algo natural que faz
parte do desenvolvimento, das descobertas, das experiências pessoais
e principalmente da expressão da vida. Para vivenciar a própria
sexualidade sem culpas ou sofrimentos é necessário respeito próprio
e enfrentamento dos próprios medos, conseguidos apenas através da
ampla consciência de quem somos e da noção de nossas possibilidades
e responsabilidades.
Psicodramatista Didata Supervisora
Terapeuta em EMDR pelo EMDR Institute/EUA
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